O SONHO DESFEITO
Aristophanes Pereira
Notícia sobre o Banco Brasil – ou BB, na intimidade – é, sempre, matéria de interesse, sob quaisquer pontos de vista. Uns corriqueiros, pontuais, de âmbito restrito. Outros, podem adquirir dimensões nacionais e, até, internacionais. Sem exagero! Não me desvio, aqui, pra demonstrar, porque desnecessário.
A questão recorrente mais significativa, e de maior interesse, na mesa das chamadas “privatizações”, diz respeito aos palpites e proposições, relacionados com a privatização do Banco do Brasil S.A., do qual a União participa, diretamente, com pouco mais de 50% do capital de mando, ficando o restante com numerosos acionistas O propósito de vender o BB recrudesceu, e passou a ser um projeto em pauta, desde o começo do Governo Bolsonaro.
O ex-poderoso ministro da Economia, Paulo Guedes, também referido como “Posto Ipiranga”, pela delegação, entre jocosa e carinhosa, que lhe deu o Chefe, nunca negou ser o BB a “joia da coroa” de seu programa de desestatização, marca de sua doutrina liberal. Entretanto, as coisas não têm sido fáceis, para o arrastado programa e, no caso do Banco do Brasil, já se configura um caso de menor atenção.
O chão começou a tremer na famosa, e já histórica, reunião ministerial de 22 de abril que, tornada pública, por determinação judicial, mostrou a face oculta do Governo Bolsonaro, haja vista o baixo calão de algumas exposições, os atentados grotescos a pessoas e instituições, as amostras de mau-caratismo de alguns ministros e as propostas não republicanas de alguns.
Nessa memorável tertúlia governamental, um trecho da exposição do ministro Paulo Guedes, de que participam o presidente do Banco do Brasil – Rubem Novaes – e o próprio presidente Bolsonaro, é marcante, por denunciar toda frustração do ministro com o Banco do Brasil, a fraqueza do presidente do banco e o cala-boca do presidente Bolsonaro, conforme reproduzo abaixo, pela sua contundência:
PAULO GUEDES:”O Banco do Brasil não é tatu nem cobra. Porque ele não é privado, nem público. Então se for apertar o Rubem, coitado. Ele é super liberal, mas se apertar ele e falar 'bota o juro baixo', ele: 'Não posso, senão a turma, os privados, meus minoritários, me apertam.' Aí, se falar assim 'bota o juro alto', ele: 'Não posso, porque senão o governo me aperta'. O Banco do Brasil é um caso pronto de privatização"(...) "O senhor já notou que o BNDES e a Caixa, que são nossos, públicos, a gente faz o que a gente quer. Banco do Brasil, a gente não consegue fazer nada e tem um liberal lá. Então, tem que vender essa porra logo".
Em continuidade, Paulo Guedes provoca o presidente Rubem Novaes, pedindo-lhe: “Confessa o seu sonho” e ele responde, titubeando: “Privati... em relação à privatização..” No que é, prontamente, interrompido pelo presidente Bolsonaro: : “Faz assim, só em 23 você confessa, agora não”.
Identifico nessa conversa – por isso a reconstruí – raízes do pedido de demissão do presidente Rubem Novaes. Além disso, o solo de Brasília pareceu-lhe muito estrumoso e movediço. Não encontro, também, na trajetória de vida, já septuagenária, do presidente renunciante, pontos significativos, que pudessem se ajustar ao perfil requerido para o exercício da presidência do Banco do Brasil. Economista, professor, escritor, comportamento sóbrio, sem gosto pelas travessuras da Politica, conforma-se mais com um consultor do que com um executivo flexível e matreiro. Aceitou o cargo, certamente, acreditando na missão acalentada pela sua ideologia liberal de privatizar o grande BB. Ledo engano! De um lado, externamente, bateu de frente com o cala-boca do presidente Bolsonaro e o silencio cabisbaixo do seu Posto Ipiranga. De outro, internamente, com a arraigada cultura estatizante da corporação funcional e aparelhada do banco, apoiada por seus suportes sindicalistas, de associações afins e extensões legislativas.
É meio suicida a missão de ocupar a presidência do Banco do Brasil, comprometido com a tarefa de vende-lo à iniciativa privada. Poderia dar aqui as razões para isso, como já falei em outras manifestações, mas seria repetitivo, no momento. Digo, apenas, que isso, um dia, poderá acontecer, se assim se tornar necessário, e a Sociedade brasileira o permitir. Enquanto isso não ocorrer, o ministro Paulo Guedes fale menos e aja mais. Vá cuidar de outros importantes deveres do seu superministério, das emergentes desarrumações causadas pela pandemia da Covid-19 e das reformas postergadas há tanto tempo.
Quanto ao Banco do Brasil, bote lá um dirigente experimentado(cuidado com o currículo), com habilidades políticas, na interação com os públicos internos e externos. Versado nas lides bancárias, com visão de futuro, para entender – como já vem fazendo o nosso competente Banco Central – as profundas e revolucionárias mudanças comportamentais e tecnológicas que estão ocorrendo no mundo da moeda e do credito. Do contrário, não haverá sequer o que vender, pois o novo banco não é bem físico. É quase virtual, feito de confiança, expertise, um pouco de gente e muita Inteligência Artificial. Boa sorte ao novo presidente do Banco do Brasil.
NOTA: VENDA DE CREDITOS AO BTGPACTUAL-Pelo que conheço, e me recordo da linha operacional do BB, não faz muito sentido essa suspeição que se quer levantar sobre uma velha e corriqueira prática de venda, com expressivo abatimento, dos chamados “créditos podres”, encostados em “créditos em liquidação”, por força de regulamentos internacionais(BIS-Acordo Basilea).No BB nada se faz pelo mando e vontade de uma só pessoa, mas pelas recomendações, justificadas ao longo de uma extensa linha hierárquica, da Agencia à Direção Geral. A conferir.
Jaboatão dos Guararapes, 30/7/2020.