É A MODERNA TEORIA MONETÁRIA, ESTÚPIDO!
Aristophanes Pereira
PARTE I - ANTECEDENTES
O nevoeiro, com nuvens carregadas de desentendimento, desunião, incompreensão e asneiras, está tão denso, no Brasil de hoje,
que, para usar uma velha expressão, “dá pra cortar de faca”. Na
verdade, não é só de hoje. Vinha se formando há muito tempo. Agravou-se,
com a chegada dos ventos doentios da pandemia do Covid-19. Ai embaralhou tudo!
Para sairmos bem dessa situação insuportável, devemos ter discernimento, tolerância de coalizão e competências, com o que poderemos “transformar o limão em saborosa limonada”. É difícil?! É, mas é factível.
Pelo poder do discernimento,
devemos assumir – patrioticamente, sem sectarismo – que chegamos ao
ponto limite do nosso equilíbrio institucional, em prejuízo da
governabilidade. Qualquer passo em falso pode derrubar o edifício, em
equilíbrio instável. Portanto, a solução de sustentação e de reversão
para a estabilidade impõe uma coalizão das forças mais expressivas. O pequeno e sábio Israel acaba de chegar a esse entendimento, bem como a amadurecida Inglaterra do Brexit. Depois, virá o aproveitamento e aprimoramento das competências disponíveis, para a formulação de um projeto diversificado de novas construções. Não disse reconstrução!
Tenho falado, com certa insistência sobre esse tema, e volto, buscando, aqui, melhor clarear a questão. No plano político-institucional, começamos com o impeachment da presidenta, quase nos afundamos no mar revolto de um governo transitório, debilitado e poluído pelos detritos da velha corrupção sistêmica. A eleição democrática de um novo governo não se deu pela via de programas e projetos para o desenvolvimento nacional, mas pela emoção momentânea,
causada por um candidato pitoresco, tosco e vitimado, porém claramente
devotado ao banimento da ideologia corrupto-destrutiva do aparelhado
comuno-petismo. Nas circunstâncias, foi o possível.
Infelizmente, em vez de resolvermos os problemas pretéritos, arranjamos mais um, dissimulado
pelos exaltados cantos da vitória, pelas manifestações de grupos
divisionistas e, principalmente, pela expectativa frustrada de um projeto de desenvolvimento nacional consistente.
De lá para cá, perdemos tempo precioso, tentando implantar – em meio àquelas nuvens de desentendimento, desunião, incompreensão e asneiras – reformas velhas, que enferrujaram nos armários legislativos, ficaram desatualizadas e incompatíveis com o novo mundo que a doença do Covid-19 viria revelar.
PARTE II – O QUE FAZER
Ainda assim, há esperança de se fazer a limonada, porque há frutos, em novos ramos, maduros e proveitosos. Tais
frutos desabrocharam pelas mudanças heroicas e críticas que fomos
capazes de exercitar, no enfrentamento da crise pandêmica, e que
evidenciaram amplas possibilidades de se tornarem mutações permanentes. Há toda uma nação ainda capaz de reagir.
Vicejou, também, o entendimento de que velhos paradigmas podem e devem ser quebrados, e desenvolvidos novos modelos.
Uns de eficácia já comprovada, no enfrentamento da crise de saúde, que
transbordou para os planos social e econômico, e outros, como rebentos
indisciplinados, que se rebelaram contra o status quo antes vigente. Há um pais capaz de construir.
Em síntese, se alguém estranhasse o que poderia animar esse novo ambiente de construções, eu
me arriscaria, pra responder, a adaptar aquela resposta de James
Carville, ao explicar a surpreendente vitória do matuto Bill Clinton
sobre Bush, com o pais em recessão: “É a moderna teoria monetária, estúpido”!
Sim, existe uma Moderna Teoria Monetária(MMT,no
original em Inglês), todavia rechaçada por 99, dentre 100, acreditados
economistas das diversas escolas, mundo afora. Alguns sequer querem
saber de que se trata!
Eu, apesar de não ser um especialista nos saberes da ciência(sic) econômica, tenho algumas leituras e vivências, como bancário e engenheiro de projetos econômicos. Sempre estranhei o abandono pelos Estados Unidos da América do chamado “padrão ouro”, em 1971. Proclamou, então, unilateralmente, que o seu dólar não seria mais conversível em ouro, e passou a imprimi-lo sem lastro, apoiado na pujança da nação e na preferência dos países por uma moeda de reserva global, ampla e alegremente aceita.
Hoje, entendo que estava, na prática, lançando há meio século o pilar fundamental da Modern Monetary Theory(MMT), cujo teorema principal estabelece:
Um
país com sua própria moeda fiduciária, (como o Real do Brasil), não
precise se preocupar com o acumulo de sua dívida, vez que sempre pode
imprimir mais dinheiro para pagar suas despesas.
Este revolucionário postulado da MMT é complementado por alguns importantes corolários, como a severa disciplina no controle da inflação; uma saudável recomendação para gastar em empreendimentos produtivos, além de juros baixos e outros procedimentos nas áreas fiscal e cambial, que não cabe aqui alongar.
Desconfio que o vírus dessa Moderna Teoria Monetária(MMT) já está circulando em muitos ambientes acadêmicos e, até, em centros de decisões econômicas. Um dos pais do Plano Real, André Lara Rezende, enaltece a teoria no seu recente livro "SENSO E CONTRASSENSO: POR UMA ECONOMIA NÃO DOGMÁTICA" (Portfolio-Penguin), O acreditado economista Roberto Macedo, em recente coletânea de artigos, no “Estadão”, tem defendido a prática do “Quantitative Easing(QE)”, que traduz como “afrouxamento monetário”, e pode ser um parente próximo da MMT. Também, o Banco Central do Brasil, sob a batuta de Roberto Campos Neto(excelente
linhagem) já derrubou, de forma inédita, a inexpugnável taxa básica de
juros, controla a inflação, administra com dosagens equilibradas o
câmbio e, mais recentemente, despejou dinheiro nos bancos, liberando
bilhões do antes amealhado “depósito compulsório”. Por fim, a própria
freada das atividades econômicas, por força do confinamento social, no
mundo e aqui, mostrou que é possível e necessário botar dinheiro vivo no mercado, aos trilhões, abrindo as casas-da-moeda dos Governos, inclusive o brasileiro, com seu “Orçamento de Guerra”.
Creio que o Brasil,
com uma economia de grande porte e diversificada – no agronegócio, nas
indústrias e nos serviços – mas padecendo ociosidades, obsoletismos e
recessão, com desemprego perturbador e anseios sociais inadiáveis, carece, urgentemente de uma sacolejada vigorosa, sob a égide de um projeto de âmbito nacional, coerente e integrado, como temos sugerido em artigos anteriores, e voltaremos e explicitar num próximo encontro.
Nada disso terá factibilidade se persistirem as nuvens de desentendimento, desunião, incompreensão e asneiras.
Jaboatão dos Guararapes(PE), 21 de abril de 2020
PS. Dedico este escrito à memória de Tiradentes, rebelado contra a política monetária e fiscal do Colonizador. (Imagem:Crédito do DNOCS, no Google)