Prezado Anônimo das 20:41, na postagem BRASIL POLUTO, de 30/05/2017
Na minha provecta idade, uma das coisas úteis que creio, ainda, devo fazer é dizer o que penso, ou o que penso que penso, pois, no final de contas, o que o nosso intelecto exterioriza é o produto do que recebeu, processa e sente. Por isso, mordi a sua isca provocante, a despeito do anzol anônimo.
Não tenho conhecimento histórico, nem memória vivida de crise tão complexa como esta em que o nosso país está mergulhado, com risco de afogamento. A parte mais triste e decepcionante dela é que se trata de uma crise que poderia ter sido evitada. Ela não chegou repente. Tem raízes no passado, e para entende-la temos que acionar a Máquina do Tempo.
Recordo que os governos militares(1964-1984), de amena ditadura, cometeram seus erros de repressão e de privação de liberdades. Entretanto, construíram, modernizaram e entregaram o país à nova classe política, sob ambiente da tolerância, liberada para adotar diretrizes distintas e escrever uma nova constituição(1988). Antes, amargamos a perda frustrante de um líder “deposto” pela fatalidade. Lutamos contra as adversidades de choques externos, hiperinflação e engolimos meizinhas de planos econômicos. Por termos embarcado na demagogia de um mágico salvador da pátria, quase saímos da rota, preservada pela renúncia, no andamento de inédito processo de impedimento constitucional.
Depois, vieram Itamar e FHC, numa sequência harmoniosa, tendo como pontos de partida a derrota da hiperinflação, o respeito às instituições, projetos exequíveis, retomada do desenvolvimento e progressiva estabilidade econômica. O ufanismo nacionalista das “brás” estatizantes, começou a ser desmontado, para diminuir custos, combater a ineficiência e o ambiente germinador de corrupção. Em 8 anos, de 1995 a 2002, a taxa média anual de crescimento do PIB ficou em torno de 2,5%, sempre positiva, mas travada, carregando o peso de estrangulamentos estruturais herdados da “década perdida”(1985-1994).
Aí, em 2003, finalmente, chega “o cara” e seu glorioso PT. Até votei nele, cheio de esperanças e animado por infantil confiança. Não recebeu um pais quebrado, mas em marcha, nos trilhos, pacificado, e com indicadores de rumos e projetos. Ingrato, não reconheceu, o que é natural nas sucessões, até entre aliados. Numa histórica “Carta ao Povo Brasileiro”(junho 2002), para angariar credibilidade e adesões, prometeu “mundos e fundos”, alinhavados pela retórica de chavões e obviedades.
De posse de um país governável, apontado, Lula teve a sensatez(com Meirelles e Palocci) de seguir uma política econômica ortodoxa, enquanto, no discurso petista, reclamava da “herança maldita” e das práticas “neoliberais”. De um lado, angariou a confiança dos mercados e investidores e, de outro, foi bafejado pela sorte dos ventos internacionais, principalmente vindos das relações com a China.
Para não alongar tão sumária análise, Lula terminou os seus dois governos(2003-2010), com excepcionais índices de aprovação. Acima de 80% o qualificaram entre bom e ótimo. Entretanto, alguns erros, difíceis de enxergar, a olho nu, não foram corrigidos; outros foram ampliadas e, pior, novos foram cometidos. Esses descuidos e práticas viriam a cobrar preços elevados, no futuro...
A reconhecida e reclamada pauta de reformas permaneceu intocada(Fiscal-Tributária, Trabalhista, Previdenciária, Política...). Sobre a importância dessas reformas, cabe lembrar que o famoso estudo que criou o conceito de BRIC(Brasil-Rússia-Índia e China), em 2001, ao prever o futuro dessas quatro economias emergentes(depois se introduziu o S, de África do Sul) vaticinava que, no caso do Brasil, “o pais perderia a corrida, caso não realizasse as profundas e inarredáveis reformas de que necessitava”.
Outro erro grave decorreu da negligência com a melhoria da estrutura física e de suporte operacional, como estradas, portos, aeroportos, energia, dentre outros. Muitos projetos empacaram por falta de uma racional e honesta alocação de recursos, ou por ranços ideológicas, na eleição de agentes públicos e privados. Casos emblemáticos são, ainda hoje, a Petrobrás e seu pré-sal; a Transposição do São Francisco, a Refinaria Abreu e Lima...
Dentre os novos erros, sobressai um, especial e premeditado: o “Projeto de Poder”. Um novo sistema de governo, exclusivo do Partido dos Trabalhadores, em busca da perpetuação, introduziu o câncer do “aparelhamento”, com metástase por todo o organismo do Estado, numa maléfica combinação de incompetência, hipertrofia da máquina pública e corrupção. No campo político, adubado pela esculhambação partidária, criaram-se fundos de financiamento/aliciamento partidários, a coalizão monetária(mensalão), os tais campeões nacionais(BNDES/BB/CEF/Fundos) e as conexões internacionais(Petrolão/Empreteiras).
Foi esse Brasil obeso e troncho, enganosamente saudável, que o projeto continuísta de Lula e do PT entregou ao Poste Dilma, em 2010, com a conivência de uma maior parcela do diversificado povo brasileiro, inebriado pelas benesses sociais, displicente ideologicamente e esquecido da democrática virtude da alternância do Poder.
E mais um erro crasso foi cometido pelo feiticeiro, cujo feitiço virou contra ele: esqueceram de combinar com o vírus latente da Crise e com o jeito de ser do Poste, desobediente e autossuficiente. E deu no que deu: A gerentona de Lula e do PT terminou sendo demitida(2016), não somente pelo crime menor das “pedaladas”, mas, principalmente, pelo conjunto de sua péssima obra: estelionato eleitoral; mais de 10 milhões de desempregados; PIBs negativos; descrédito internacional; Petrobrás arrasada; desvios e deficits nos fundos de pensão estatais; 35 partidos, disputando, acachorradamente, 39 ministérios; Previdência Social falida; Indústria Nacional ananicada; descontrole da Inflação; Real aviltado, além de outras mazelas. Tudo isso em meio à arrogância e à incitação belicosa de “movimentos sociais” e sindicais(Nós e Eles).
Esses foram os indigestos ingredientes da sopa de pedra que serviram ao Presidente, sucessor de Dilma, Michel Temer, na sequência do tortuoso rito constitucional do impeachment. Sopa servida num ambiente muito distinto daquele da transição Collor-Itamar, onde predominou o consenso de um pacto nacional, para enfrentamento e solução dos problemas da época.
Contaminado pelos erros de Dilma, sem consenso, com escasso capital político, comprometido com os “amigos” e sem a pureza dos santos, o Presidente Temer entrou numa guerra de guerrilha, no meio de pesado e mortífero tiroteio, com emboscadas e traições: O PT e seus “exércitos” de inconformados; O popular Bunker de Curitiba, com tiros certeiros; Casas Legislativas vulneráveis, atirando pra todos os lados; Procuradores e Policiais armados com metralhadoras giratórias, orientados por bandidos delatores, e um Tribunal de última instância, dando tiros de misericórdia. No devassado bastião presidencial, as baixas, as enganações e o fogo amigo.
Saindo dos cenários metafóricas, o certo é que o Governo Temer, em um ano, sem prejuízo das garantias e ritos constitucionais, conseguiu avançar, abriu uma clareira reformista, e já logrou contabilizar valores macro econômicos e sociais positivos e entregar alguns produtos e serviços. Devotado às reformas, apegou-se a projetos que já começam a ser votados, com perspectivas de sucesso. Adoraria, até 2019, desfrutar de um espaço de trabalho em que muito ajudaria quem não atrapalhasse.
Entretanto, propósitos imediatistas, de origens variadas e naturezas distintas – ideológicos, partidários, personalistas, corporativos, mafiosos e alguns poucos bem intencionados – miram somente o efêmero alvo presidencial, esquecendo objetivos nacionais de muito maior expressão e grandioso interesse público.
Tirar o Presidente, neste momento, por motivo de seus alegados e supostos crimes constitui uma equivocada avaliação da relação custo-benefício, que, no mundo real, já vem ocasionando prejuízos incomensuráveis, diretos e indiretos. Ademais, tais supostos crimes seriam facilmente anulados, caso o Professor Temer, data vênia, deixasse de lado o Direito convencional e abraçasse os princípios do moderno Direito Ilusionista, tão bem difundido pelo emérito Prof. Lula da Silva, a saber: a) No caso do Deputado da mala: “Esse rapaz é um aloprado”. b) A gravação de Joesley: “Não me lembro. Vejam pelo arrastado da conversa que eu cochilei o tempo todo.”c) O julgamento da Chapa Dilma-Temer: “Isso é uma palhaçada. Estamos em 2017 e a Presidenta já foi impichada”.
Vamos deixar o Presidente Michel Temer, ao lado de sua bela Primeira Dama, governar o Brasil, por mais 18 meses, e aproveitar esse tempo para trabalhar, fazer as reformas, principalmente a política, com regras e delimitações que nos permitam eleger bons representantes e um grande presidente. Fora disso, é brincar com fogo...
Janga,junho-2017.